4 meses.

Para quem pensa em engravidar, eu vou logo dizendo: essa fase é sensacional. Os enjôos, os cansaços excessivos, os abusos e as neuroses já passaram. O bucho começa a aparecer ao ponto de você não ficar constragida em entrar numa fila preferencial. As pessoas já olham para você não como uma gorda, mas como uma grávida, e você começa a desfrutar do prazer, inlcusive, daquela alisadinha marota na barriga com óleo de amêndoas durante o banho. À noite, a situação complica um pouco, porque depois do jantar bate um banzo fenomenal. E como o sofá da gente não é um dos mais confortáveis do mundo, levando-se em conta que por orientações médicas sempre deito virada para o lado esquerdo, levanto, com frenquência, cheia de dor nos quartos. De resto, tá tudo lindo.



Já comecei aqueles rituais de grávida, muito prazeros, por sinal. Coloco fones de ouvido com o set list pessoal dos pais na barriga pra Helô não correr o risco de gostar de pagode quando crescer, leio livrinhos leves em voz alta e converso com ela com uma certa regularidade. Já serginho, todas as noites, bate altos papos com meu umbigo, com direito a palavras doces, beijos e declarações de amor. Com a barriga redondinha e sem o famigerado bucho-quebrado-de-mulher-que-limpa-parabrisas-no-sinal, tão característico do começo da gravidez, também rola começar a usar aquelas calças de cintura superbaixa, que acompanhadas de uma blusinha mais justa, colar e rasteirinhas (ou um all star velho de guerra), confere a qualquer caminhada até o trabalho um glamour diferente.

Não ter do que reclamar nessa fase soa até meio monótono, mas se a gravidez inteira fosse assim, acho que eu viveria grávida.

Tá, esqueci a abstinência da cerveja. Então, retiro o que disse.

No começo, o meu palpite era menino.

Que bom que eu errei.




Água que grávida não bebe.



É isso aí. Já são quatro meses sem minha gelada querida. Só nos meus 20 anos, quando matei meu pai de desgosto por conta de uma ressaca sem precedentes, passei tanto tempo sem beber. Hoje, sempre que a gente sai é a mesma coisa: eu tento agir normalmente mas, invariavelmente, me pego tirando os olhos do meu copo por segundos na esperança da água de côco virar cerveja quando eu voltar a olhar.

Tenho amigas do estandarte da cachaça que dizem não terem sentido falta de cerveja durante a gravidez. Queria eu chegar nesse nível elevado de espiritualidade, mas meu corpinho, antes de 58 quilos, ainda está apegado a desejos materiais.

Daí, confesso que sair à noite é, muitas vezes, um saco. A farra até começa bem, com todos dividindo o mesmo degrau na relação álcool x conversa, mas no decorrer das horas, quando você vê que dois ou três copos já são seis ou sete, a minha chatice sem a maquiagem da cerveja se faz presente e já não vejo mais graça nos comentários empolgados ou nas risadas sem motivo. Não vou nem entrar no quesito dos sabores, porque nada nessa vida é mais prazeroso que um gole de cerveja bem gelada depois de uma semana de trabalho estressante.

Ah, filhota querida, o que mamãe não faz por você.

Minha gente.

O que eu faço com essa sede toda que não páro de sentir? Jesus-Maria-José!

É ela.



Vem aí a nossa princesa, com mãos de pianista e alma de moleque. Que vai gostar de livros e de ir para o Arrudão com o papai. Que vai conhecer o mundo com uma mochila nas costas e sempre voltar com um "eu te amo" cada vez que a saudade de casa apertar. Que, assim como o pai, vai ser a menina mais doce que existe, e como a mãe, nunca vai tirar o all star do pé. Que vai achar uma vida pouco tempo para tudo que ela vai querer fazer. E que, nem chegou, já é o nosso amor, de tão querida e festejada nessa casa.

Você já estava prometida pra gente, pequenina. Há 4 anos.
Seja bem vinda, Heloisa Lisboa Kyrillos.

Menino ou menina?



Dependendo da boa vontade do(a) baby, a gente fica sabendo nessa sexta. Que gire a roleta.

Juliana, Sergio, baby e o mundo maravilhoso das contas.

Em que estágio da gravidez é normal começar a comprar coisinhas? Porque eu não comprei uma meia sequer. Não que eu não queira, mas é que não tem sobrado um certo para tal no final do mês. Fora que, como ainda não sabemos se o quarto vai estar mais para lilás (rosa, nunca) ou para azul, estamos estrategicamente adiando o endividamento.

Dos parentes, herdamos alguns dos itens mais onerosos da interminável lista infantil: berço, armário, banheira, carrinho, bebê conforto, alguns brinquedos, bolsa de maternidade e cadeira de amamentação. Só lembrando que, como só nasce macho nessa cidade, e isso inclui os netos da minha família e da família de Serginho, a maior parte dos objetos está na paleta dos azuis, então vamos torcer por um menino ou por uma menina de muita personalidade. Já dos amigos, ganhamos algumas roupinhas de recém-nascido muito lindas, incluindo dois conjuntinhos do glorioso tricolor pernambucano que o pai exibe com muito orgulho.

Mas o volumoso, o numérico, o cifroso da lista ainda está por vir. Não me olhe assim, eu juro que sou uma mãe legal. Mas é que o apartamento foi gerado antes do baby, então suas dívidas precisam ser prioridade para que se abra caminho para as seguintes. Prometo que até janeiro a gente compra, aos pouquinhos, aqueles itens pequeninos de moder, de chupar, de sacudir, de agarrar, de vestir, de dormir e de num-sei-quê-mais-lá.

Já a decoração do quarto, essa só fica para janeiro, quando eu vou tirar férias e ter uns dias de folga para dar dedicação exclusiva. Oxalá que o(a) baby não decida nascer nesse tempo, porque aí eu vou ter que dormir no colchonete das visitas.



A ilustração é desse rapaz sem talento aqui.

Boca de lata.

Se alguém souber aqui alguma dica para suavizar o efeito metal que fica no gosto da saliva, eu agradeço muitíssimo. Porque não tem água de côco e maçã que dê conta, meu senhor.

Translucência nucal.

Não vou perder muito tempo com esse tema porque já bastam as noites em claro e as crises nervosas, regadas à uma imaginação bastante fértil, que antecederam o exame. Obrigada ao meu doce e atencioso médico (beijo, doutor Carlos) que fez o ponteiro do relógio voltar a andar.



Foto de Rowena.

Susto.

Ó, só para deixar claro, já já eu entro na parte boa da gravidez, eu prometo. Mas antes dos enjôos entrarem em ação, outra coisa tirou o meu sono: escapes, talvez provocados por algum esforço físico. Para quem não sabe, escapes são pequenos sangramentos que às vezes rolam durante a gravidez e que não necessariamente são sintomas de processo abortivo. É que, durante a fixação do saco gestacional, alguns vasos sanguíneos podem se romper liberando pequenas quantidades de sangue. Não é muito não. Pouquinho mesmo e de cor escura, como no começo ou no final da menstruação. Até aí, tudo bem. O detalhe é que eu não sabia disso e, depois do ocorrido, tudo que acontecia da cintura para baixo era tragédia.

Liguei para a minha obstetra que, por ser objetiva demais e que por isso mesmo virou ex, me disse à queima-roupa: isso pode ser um princípio de aborto. Choro eu de um lado, chora Serginho do outro. Nem o telefonema para Ivana, a progesterona receitada pela médica (até então desnecessária, porque a minha estava bem alta devido ao meu constante consumo de soja) ou as palavras doces dos meus amigos de trabalho conseguiram por de volta o meu pensamento nos eixos.

Isso é castigo (maldito colégio de freiras), Deus não gostou de eu ter me apavorado quando soube da gravidez (maldito colégio de freiras), agora que eu estou feliz e tranqüila vão me tirar meu filho por falta de merecimento (maldito colégio de freiras).



Dois meses de desespero e tensão depois, percebo que o baby nem chegou e já está me ensinando um bocado de coisas. A principal delas está no universo da auto-suficiência: não gosto de incomodar, não gosto de pedir ajuda, não gosto de dever favores, não gosto de me sentir dependente. Eu sou assim. Ou, pelo menos, era. Porque desde que engravidei descobri que as conjugações na primeira pessoa vão para o saco e que fazer tudo em nome da bandeira gravidez-não-é-doença é teimosia, para não dizer ignorância. Que eu, depois de grávida, não posso continuar agindo como se nada tivesse acontecido, dando conta, integralmente, de tudo que cai no meu colo e que esse orgulho todo não vai me levar a lugar nenhum. A não ser pra minha cama, deitada, de molho, rezando e pedindo a Deus, Alá, Buda, Jeová e todas as forças que não machuque o meu(a) filho(a).

Dramas à parte, já estou no segundo trimestre, está tudo sob controle e os riscos maiores já passaram. Tomara.

Essa é uma das fotos lindíssimas de Elle Moss.

E já que o assunto é esse.

Um receitinha para quem não sabe cozinhar, tipo eu. Quem tenta diminuir o consumo de carnes, tipo eu. Quem gosta de berinjela, tipo eu. Quem tem tempo pra se dedicar à cozinha, tipo quem?



Berinjela Empanada
Ingredientes:
2 berinjelas grandes com casca
2 ovos inteiros
Sal a gosto
Farinha de rosca para empanar
Óleo para fritar

Preparo:
1. Corte as beringelas em rodelas de cerca de 1 cm.
2. Bata os ovos e acrescente sal (deve ficar mais para salgado, para temperar a beringela).
3. Passe primeiro no ovo e depois na farinha.
4. Frite em pouco óleo (prefira o de canola, que ofende menos).
5. Coloque para secar em cima de papel toalha.

99% natureba.



Na minha casa não se usa detergente, só sabão de côco raspado. Não compro alimentos em bandejas de isopor e, sob hipótese nenhuma, sacos de lixo (no lugar, uso as poucas sacolas plásticas trazidas do supermercado). Procuro comprar alimentos de produção local, evito comer carne às segundas-feiras (mas veja bem, eu gosto de carne), sou amiga da soja e de proteínas alternativas. Refrigerantes? Só em caso de sanduíche, pizza ou ressaca da braba.

Sou mulher, adoro fazer umas comprinhas, mas livros de sebo são sempre mais interessantes que os novos, porque têm um passado para contar além da própria história. Por questões de conveniência, vou a pé pro trabalho. Trocaria, tranquilamente, uma viagem de primeira classe por outra de trem e um apartamento à beira-mar por uma casa com uma horta e muitos cachorros. Procuro não gastar com coisas que não preciso, apesar de ser difícil, nem vou deixar que meu(a) filho(a) seja criado(a) querendo mais do que pode ou do que dever ter.

Tudo isso foi pra dizer que uma vez recebi um site enviado por uma grande amiga do Rio com fraldas lindíssimas de tecido que super combinam (como ela mesma fala) com essa filosofia ecológica. Eu catei para colocar aqui mas não achei, então vão outros. São todos muito legais, mas não tem quem me faça lavar 10 fraldas de tecido por dia, ok? Prometo não deixar a torneira aberta enquanto tomo banho nem a luz acesa em ambientes vazios, para compensar.

Fralda de Pano
Colorida Vida
Planeta Sustentável

Tentando não estressar.



Respira, baby, que vida de mãe publicitária não é moleza. Mas eu prometo que vou fazer de tudo para filtrar os problemas, ok?

Uma ressaca que durou um mês e meio.



Ok, agora vem a parte chata e nem um pouco mágica da gravidez: a fase dos enjôos. Quem teve sabe do que eu estou falando. Você sente fraqueza, sonolência, gosto de metal na boca, vontade de vomitar, sensação de impotência, impaciência, tontura e um olfato extremamente apurado mas muito pouco seletivo, só detecta cheiro ruim.

E cada um que viesse com uma dica para aliviar o ônus da tão sonhada gravidez. “Chupa gelo, que melhora”. “Cheira casca de limão ralado, que alivia”. “Come salgado misturado com doce, que ajuda”. Nada do que eu fazia surtia efeito e a única receita eficaz era dormir para ver se, pelo menos durante o sono, eu voltava a ser uma pessoa normal.

Claro que essa experiência me ensinou algumas coisas que funcionam mas, veja bem, não são regras nem garantem a satisfação do cliente ou o dinheiro de volta.

- Elimine as sopas da sua vida, a não ser aquelas bem cremosas. Quanto mais líquidos, maior era a minha vontade de vomitar.
- Mesmo não ingerindo líquidos, eu não abria mão da água de coco, que ajudava a hidratar, principalmente nos momentos pós-vômito, que foram poucos, porque eu me recusava a colocar pra fora tudo que comia a custa de tanto sacrifício, mas inesquecíveis.
- Banana de manhã cedo também é uma boa pedida. Não é na vitamina nem amassada com leite em pó. É pura mesmo. Como não tem cheiro forte, a banana não atiça o olfato e ainda dá energia para a fadiga matinal. Agora torça para ela não começar a estragar. Banana madura, para um olfato de mulher-prenha-enjoada, é um alarme poderoso que se percebe do hall de entrada do prédio.
- Aproveitando a dica acima, não deixe as frutas ficarem muito maduras na sua cozinha. Ao menor sinal, retire a casca e leve para a geladeira em potes plásticos ou faça salada de frutas. O cheiro é desesperador, depois não diga que eu não avisei.
- Se o seu marido, assim como o meu, fuma, peça para fazê-lo de varanda fechada e, ainda assim, lavar o rosto depois do cigarro. Só de lembrar eu já tenho contrações no estômago.
- A tentação de comer carboidratos simples (pão, massas, batata) é grande, porque não tem muito cheiro nem paladar, mas vá com calma. Troque pelos compostos (integrais) ou, se preferir, pelas raízes. O efeito é o mesmo e você não corre o risco de transformar tudo que conseguiu comer em açúcar.
- Isso tem em qualquer site de gravidez e é a mais pura das verdades: nunca fique muito tempo de estômago vazio muito menos encha o estômago demais. É enjôo na certa e, no caso da primeira opção, você também corre o risco de desmaiar.
- Tomar derivados do leite à noite também não me ajudava muito. Principalmente iogurtes. Eles fermentavam no estômago e o resto da história dá pra imaginar.
- Maçãs são muito úteis também, porque além de matarem a fome e serem fáceis de carregar, ajudam a limpar a boca. Acredite, você vai ficar com enjôo da própria saliva. Mas quanto a isso não tem muito o que fazer não.

Mas não se aperreie. Essa fase passa rápido e depois o conto de fadas começa. Você começa a sentir, sem que enjôos tirem sua atenção, todo o amor proporcionado pela maternidade. Até alguém como eu, que vislumbrava filhos só depois de rodar pelo mundo com uma mochila nas costas (rá), descobre as maravilhas de ser mãe e um talento todo especial, até então desconhecido, com crianças.

Como diz Serginho, não sei como eu conseguia viver antes sem ter um filho no pensamento.

Ilustração tirada do circus museum.